MiningWatch alerta que Portugal “não está pronto” para projetos mineiros estratégicos

A rede de monitorização independente MiningWatch Portugal considera que o país “não está pronto” para projetos mineiros estratégicos nem para “licenciamento ambiental e social acelerado”, como proposto pela Comissão Europeia na estratégia para matérias-primas críticas, ontem divulgada.

“Na avaliação da MiningWatch Portugal, o país não tem actualmente nenhum projeto extrativo apto para ser classificado como projeto estratégico, nem está pronto para um licenciamento ambiental e social acelerado, tal como proposto pela Comissão”, salienta a organização, em comunicado hoje divulgado.

A posição surge no dia em que a Comissão Europeia divulga metas para 2030, como que 10% das matérias-primas críticas utilizadas na União Europeia (UE), como lítio ou magnésio metal, sejam extraídas em solo europeu, e que o mesmo aconteça com 40% da refinação e com 15% da reciclagem.

Bruxelas estipula também um máximo de 65% de dependência face a um único país terceiro, numa altura em que a UE importa a quase totalidade de algumas das matérias-primas críticas de países como a China e em que se prevê que a procura aumente acentuadamente nos próximos anos.

A Comissão Europeia avança assim com um novo pacote sobre matérias-primas críticas para acelerar a extração e refinação na UE e ultrapassar vulnerabilidades face a perturbações no abastecimento ou a tensões geopolíticas, como a Lusa já tinha avançado.

Na proposta, também tal como avançado pela Lusa, Bruxelas sugere a designação de projetos estratégicos, que poderão beneficiar de licenças mais rápidas (de 12 meses para extração e 12 meses para refinação e reciclagem, quando chegam a demorar até cinco anos), de menor carga administrativa e de eventual financiamento comunitário, bem como a aposta no armazenamento destas matérias-primas críticas.

Em causa estão matérias-primas como o lítio e o cobalto, necessárias por exemplo para o fabrico de baterias e motores elétricos, ou silicone, usado para produção de semicondutores.

Estes materiais permitem o desenvolvimento de setores estratégicos como das energias renováveis, carros elétricos e tecnologias digitais.

Para o fundador da MiningWatch Portugal, Nik Völker, há “riscos elevados de que os prazos apertados propostos pela Comissão apenas venham acrescentar à evidente falta de pessoal e financiamento das autoridades portuguesas”.

“Assim, iremos verificar ainda mais casos de incumprimento ambiental ou social relacionados com as pedreiras e minas em Portugal e, tendo em conta as exigências da Comissão, nenhum projeto no país está atualmente em condições de cumprir as normas de referência propostas”, adianta Nik Völker, citado pela nota.

A extração de lítio tem vindo a ser contestada por comunidades locais em Portugal.

Estima-se que a procura da UE por baterias de lítio, que alimentam os veículos elétricos e de armazenamento de energia, aumente 12 vezes até 2030 e 21 vezes até 2050, face aos valores atuais. Já a procura de metais de terras raras na UE, utilizados em turbinas eólicas e veículos elétricos, deverá aumentar cinco a seis vezes até 2030 e seis a sete vezes até 2050.

Atualmente, a UE depende da China para materiais como metais de terras raras ou magnésio.

Além disso, 98% do boro que chega à UE, utilizado nas tecnologias eólicas, nos ímanes permanentes e na produção de semicondutores, provém da Turquia, enquanto 63% do cobalto mundial, utilizado em baterias e ligas leves de alta resistência para os setores da defesa e aeroespacial, vem da República Democrática do Congo.

Por seu lado, a África do Sul é responsável por fornecer 71% das necessidades da UE para os metais de platina.

Fonte: Green Savers

Bruxelas propõe hoje regras para indústria sem emissões e matérias-primas ‘made in UE’

A Comissão Europeia vai hoje apresentar uma lei para indústria sem emissões poluentes na União Europeia (UE), visando responder aos subsídios ‘verdes’ dos Estados Unidos, e vai propor regras para acelerar a extração e refinação de matérias-primas críticas.

Numa altura em que a UE tenta acabar com a dependência energética russa e atingir as suas metas ambientais – como a neutralidade carbónica em 2050 e a redução de pelo menos 55% das emissões poluentes até 2030, estipuladas no Pacto Ecológico Europeu -, Bruxelas apresenta hoje uma nova lei comunitária com vista a desenvolver tecnologia ‘limpa’ em solo europeu, mercado que se estima que valerá cerca de 600 mil milhões de euros até 2030.

A proposta surge depois de, nos últimos meses, as relações transatlânticas terem sido marcadas pelo descontentamento europeu face ao plano dos Estados Unidos de subsidiar a produção local de tecnologias ‘limpas’ com 370 mil milhões de dólares (cerca de 350 mil milhões de euros), o que é considerado discriminatório e que ameaça levar as empresas europeias a abandonar o continente.

Entretanto, a UE decidiu trabalhar no seu próprio plano para fornecer incentivos às tecnologias limpas europeias, que hoje apresenta à imprensa, complementando a entrada em vigor, na passada sexta-feira, de um novo quadro temporário para auxílios estatais, que permite aos Estados-membros apoiarem, até final de 2025, investimentos em energias renováveis, em armazenamento energético e na descarbonização da indústria.

Também hoje, a Comissão Europeia avança com um novo pacote sobre matérias-primas críticas, como o magnésio ou o lítio, para acelerar a extração e refinação na UE e ultrapassar vulnerabilidades face a perturbações no abastecimento ou a tensões geopolíticas, avançaram fontes europeias à agência Lusa.

Em causa estão matérias-primas como o lítio e o cobalto, necessárias por exemplo para o fabrico de baterias e motores elétricos, permitindo o desenvolvimento de setores estratégicos como das energias renováveis, carros elétricos e tecnologias digitais.

Actualmente, a UE depende da China para materiais como metais de terras-raras ou magnésio, com a quase totalidade destas importações europeias a serem feitas naquele país asiático, dependência que Bruxelas quer evitar.

Na proposta de hoje, Bruxelas tenciona criar a designação de projectos estratégicos, que poderão beneficiar de licenças mais rápidas (que chegam a demorar até cinco anos) e de eventual financiamento comunitário, bem como apostar no armazenamento destas matérias-primas críticas, indicaram fontes europeias à Lusa.

Fonte: Green Savers

Parque Biológico de Gaia há 40 anos a educar para a conservação da natureza

A completar 40 anos, o Parque Biológico de Gaia distribui pelos 35 hectares mais de 1.000 animais de 300 espécies, a missão de educar para a conservação da natureza e o sonho de fazer a diferença.

“A expansão foi muito grande, mas o crescimento não foi só em visitantes e dimensão. A própria ideia e a utilização do espaço evoluiu”, diz o diretor do Parque Biológico de Gaia.

Em entrevista à agência Lusa, Henrique Alves desabafa sobre os desafios atuais, mas também transmite esperança e, sobretudo, orgulho no percurso de um espaço adquirido pela Câmara de Gaia, no distrito do Porto, para horto e viveiro municipal que começou por ter dois hectares e atualmente tem 35.

Admitindo que explicar o que é um Parque Biológico – porque não é um zoo, mas também não é um museu nem um jardim botânico, sendo um bocadinho disto tudo – “não é fácil”, o biólogo garante que a missão de há quatro décadas continua a mesma.

“Na década de 80 viviam-se os grandes problemas dos ecossistemas e da conservação e era necessário transmitir essa mensagem às pessoas, sobretudo às crianças (…). Como ambientalista, quando comecei nesta luta, pensei que hoje estaria muito melhor do que realmente estamos. Ainda é necessário partir muita pedra”, refere.

Diretor de um parque que “foi criado com o intuito de educar” e onde “tudo serve para educar”, Henrique Alves admite que a missão “está mais difícil”, porque “existem muita concorrência e coisas que distraem as pessoas do lema ‘pensar global e agir local’, já para não falar da guerra e dos problemas económicos”, mas porque “já não existem espaços que possam de facto considerar-se santuários”.

Mas, apesar disso, o diretor promete que no Parque Biológico de Gaia não desistirá.

“No início o perfil dos nossos visitantes era maioritariamente de grupos escolares. Atualmente tem vindo a equilibrar-se com o público regular a aumentar. Isto é um ótimo sinal”, conta.

Com 1.000 animais de 300 espécies, o Parque Biológico de Gaia recebe, em média, 102 mil visitantes por ano.

A equipa do espaço, que tem uma unidade de cuidados intensivos para animais selvagens, tem cerca de 80 pessoas, desde tratadores a biólogos, veterinários e pessoal administrativo.

No parque desde 1997, Henrique Alves conhece-o quase como a palma das mãos, mas às vezes ainda se perde ou encontra surpresas. O trabalho burocrático ocupa-o dentro do gabinete, mas não esconde que se sente “privilegiado” por trabalhar num espaço onde os “pius” dos pássaros se confundem com o barulho das crianças que por ali passeiam.

“É muito importante manter a missão, o sonho: educar para a preservação das espécies”, frisa, acrescentando o apelo para que as pessoas não larguem na natureza animais feridos ou que já não lhes são convenientes em casa, e procurem, primeiro, instituições que os possam reabilitar.

“Entregam-nos todo o tipo de animais, até borboletas. Temos um Centro de Recuperação da Fauna Selvagem que recebe anualmente milhares de bichos para recuperação: animais encontrados feridos, caídos do ninho, atropelados ou que levaram um tiro na época de caça. Se o animal estiver em bom estado é libertado na natureza. Se não estiver, fica a fazer parte da nossa coleção”, descreve.

À Lusa, e ainda em jeito de alerta, o diretor conta que até tartarugas ou répteis – animais que não fazem parte da vocação do Parque Biológico de Gaia – são entregues ali.

“É que enquanto a tartaruga é pequenina e brinca no aquário, está tudo bem. Depois, quando começa a comer o peixinho ou a morder o dedo da criança deixa de ter graça. Mas é sempre melhor entregar nos centros do que libertar na natureza onde vão competir com as outras e destruir os habitats. Atualmente, por excesso de lotação, já não temos capacidade para receber [animais exóticos], mas encaminhamos para instituições vocacionadas”, descreve.

Além de particulares, as entregas são feitas pela Brigada de Proteção Ambiental (BriPA) da PSP, pelo Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (Sepna) da GNR e por corporações de bombeiros.

Das várias estruturas de um parque que vai comemorar os 40 anos com dias abertos, festivais, oficinas e exposições, destacam-se o auditório, com capacidade para 220 pessoas, e a hospedaria, com 46 camas.

Atualmente na hospedaria, originalmente vocacionada a visitantes, escolas e investigadores, estão alojadas famílias de várias nacionalidades que tiveram de fugir à guerra que opõe a Ucrânia à Rússia.

Durante a pandemia da covid-19, a hospedaria foi “casa” de dezenas de profissionais de saúde deslocados das famílias.

O programa de comemorações inclui um encontro de educação ambiental – “40 anos de Educação Ambiental em Portugal, que futuro?” –, de 29 de setembro a 01 de outubro.

Fonte: Green Savers

O que é a madeira impressa em 3D e irá reduzir o desperdício?

À medida que nos aproximamos do futuro, o que costumava acontecer apenas na natureza está a ter lugar em laboratórios. No novo mundo da agricultura celular, os cientistas estão a produzir carne sem matar animais. E agora é a vez das árvores viverem, uma vez que os cientistas descobriram como imprimir madeira em 3D. Em vez de serem cortadas e transformadas em cadeiras, jornais, papel de parede, caixas de ovos, sacos, caixas e papel higiénico, em breve as árvores poderão continuar a crescer, escreve o “Inhabitat”.

Precisamos de árvores e madeira

Segundo a mesma fonte, à medida que a população humana global foi aumentando para oito mil milhões, com muitas dessas pessoas a precisarem de muitas coisas, continuámos a cortar árvores para fornecer uma multiplicidade de produtos. Desde o início da civilização humana, eliminámos 54% da população de árvores da Terra, de acordo com um inquérito florestal global. E enquanto nos preocupamos em proteger os elefantes e os rinocerontes dos caçadores furtivos que procuram o marfim, o produto selvagem mais traficado é na realidade o pau-rosa. Da Tailândia para Madagáscar, onde existe pau-rosa, há pessoas a tentar cortar a árvore em vias de extinção e vendê-la ao mercado de mobiliário chinês. O emaranhado com os caçadores furtivos de pau-rosa “é tão perigoso que a árvore ganhou o apelido de ‘madeira de sangue’”.

“Mas uma árvore não tem de ter madeira adequada para tornar o mobiliário adequado para que as dinastias imperiais sejam valiosas”. As árvores fornecem sombra para arrefecer os nossos bairros, remover o carbono da atmosfera, filtrar a água, limpar o nosso ar e abrandar os surtos de tempestade. Assim, a capacidade de imprimir madeira em 3D “é uma boa notícia para os seres humanos, bem como para as árvores”.

Génios do MIT revolucionam a madeira

Cientistas afiliados ao Massachusetts Institute of Technology e ao Charles Stark Draper Laboratory publicaram o seu progresso na revista Materials Today no ano passado. Iniciaram o seu trabalho a fim de reduzir o desperdício e a perturbação ambiental, aumentando ao mesmo tempo os rendimentos e as taxas de produção.

Começaram com células dos Zinnia elegans, também conhecidos como zinnias.

“Em princípio, o esforço para produzir materiais vegetais na ausência da planta de apoio não é totalmente diferente da engenharia de tecidos em sistemas de células animais”, escreveram os autores do estudo. “Em ambos os campos, as células num ambiente de crescimento estruturado e rico em nutrientes podem ser orientadas para crescer e transformar-se em produtos semelhantes a tecidos”.

As células vegetais requerem vias metabólicas diferentes das células animais, mas os cientistas foram capazes de construir sobre o campo mais desenvolvido dos mamíferos. Até agora, a maioria dos esforços de engenharia de tecidos tem-se concentrado na cultura de células animais. Os autores do estudo salientam que o seu é o primeiro trabalho a utilizar a abordagem da agricultura celular para gerar material vegetal. Pode ler aqui todos os pormenores suculentos do estudo.

Uma start-up de impressão em madeira 3D

Os cientistas do MIT podem ser os primeiros a fazer madeira a partir de células zínnias. Mas não são os primeiros a experimentar formas alternativas de fazer madeira. Há já alguns anos que uma startup chamada Forust é a madeira de impressão 3D, começando com os resíduos de madeira de serradura e lignina. Este último ingrediente é um polímero orgânico que é um dos principais constituintes da madeira.

“Percebemos muito rapidamente que os resíduos de madeira são um material que poderia ser transformado para impressão em 3D”, disse Virginia San Fratello, presidente do departamento de design da Universidade de San Jose State e um dos fundadores da Forust, à Fast Company em 2021. O seu processo envolve camadas de serradura e aglutinantes não tóxicos para recriar o grão da madeira.

“Uma árvore é feita de lignina e celulose”, disse Ric Fulop, CEO da Desktop Metal, uma empresa de impressão 3D maior que inclui a Forust, como relatado pela Fast Company. “Quando se fazem coisas a partir de árvores, quer seja mobiliário ou papel, está-se essencialmente a desmaterializar a árvore… o que estamos a tentar fazer é voltar a juntá-la”. Pode soar um pouco como um aglomerado de partículas. Mas o grão na madeira impressa em 3D percorre todo o material, para que se possa lixá-lo e acabá-lo tal como a madeira.

E há bastante serradura e lignina em excesso. A poeira desvia estes materiais dos aterros sanitários.

“Centenas de milhões de toneladas métricas de resíduos são geradas todos os anos só nos Estados Unidos”, disse Fulop.

Redução de resíduos

Uma das coisas interessantes sobre estes dois processos é que os objetos podem ser impressos em 3D nas suas formas finais. As empresas podem imprimir uma cadeira ou mesa em 3D – sem desperdício. Podem também imprimir formas complexas. Talvez o melhor de tudo, a impressão em 3D possa levar a um processo circular para a fabricação de madeira. Quando a sua velha cabeceira se desgasta ou parte, pode enviá-la de volta para o fabricante, onde pode ser moída e impressa em 3D numa estante ou cadeira ou qualquer outra coisa que o mercado exija. O mobiliário poderia ser feito de uma forma totalmente nova, livre de resíduos.

“Claro que a tecnologia de impressão em madeira 3D ainda se encontra nas fases iniciais. Mas os cientistas do MIT estão esperançosos. O seu estudo espera um futuro em que os materiais possam ser produzidos localmente, em qualquer parte do mundo, sem necessidade de luz solar ou terra”, conclui o “Inhabitat”.

Fonte: Green Savens

Praticamente nenhum lugar da Terra está livre de poluição do ar

Apenas 0,18% da superfície terrestres e 0,001% da população mundial vive em níveis de poluição considerados seguros pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de acordo com o primeiro estudo global sobre a poluição do ar.

Este trabalho, o primeiro a medir as partículas de poluição PM2.5 no mundo, revela que, nos últimos 20 anos, a Europa e a América do Norte reduziram os seus níveis de poluição do ar, enquanto na Ásia, Austrália, Nova Zelândia, América Latina e Caraíbas estes aumentaram.

Durante décadas, a falta de estações de controlo da poluição do ar impossibilitou o conhecimento de dados sobre a exposição local, nacional e global ao PM2.5 – as micropartículas mais nocivas para a saúde ambiental.

Agora, pela primeira vez, uma equipa de cientistas liderada por Yuming Guo, da Monash University, em Melbourne, na Austrália, produziu um mapa da evolução do PM2.5 nas últimas duas décadas, com os resultados serem publicados hoje no “Lancet Planetary Health”, noticiou a agência Efe.

Ao conduzir o estudo, a equipa utilizou observações tradicionais de monitorização da qualidade do ar, detetores meteorológicos e de poluição do ar por satélite e métodos estatísticos e de inteligência artificial para avaliar com mais precisão as concentrações globais de PM2.5.

O estudo detalha que, apesar de uma ligeira diminuição nos dias de alta exposição a PM2.5 em todo o mundo, em 2019 mais de 70% dos dias continuaram com concentrações de PM2.5 superiores a 15 μg/m³ [microgramas por metro cúbico].

Somente no sul e leste da Ásia, mais de 90% dos dias apresentaram concentrações diárias de PM2.5 superiores a 15 μg/m³.

Além disso, a Austrália e a Nova Zelândia tiveram um aumento acentuado no número de dias com altas concentrações de PM2.5 em 2019.

Globalmente, a média anual de PM2.5 de 2000 a 2019 foi de 32,8 µg/m3, de acordo com o estudo.

Estes dados, em contraste com as diretrizes da OMS 2021, mostram que apenas 0,18% da área terrestre global e 0,001% da população global foram expostos a exposições anuais abaixo desse limite de diretriz (média anual de 5 μg/m³) em 2019.

O estudo também mostra diferentes padrões sazonais, como níveis mais baixos de poluição no nordeste da China e norte da Índia durante os meses de inverno (dezembro, janeiro e fevereiro) e níveis mais altos de PM2.5 nas áreas do norte da América durante os meses de verão (junho, julho e agosto).

“Também registamos poluição atmosférica relativamente alta de PM2.5 na América do Sul em agosto e setembro e na África subsaariana de junho a setembro”, acrescentou Yuming Guo.

Para o cientista, conhecer estes dados é importante porque “fornecem um conhecimento aprofundado sobre o estado atual da poluição do ar externo e o seu impacto na saúde humana”.

“Com estas informações, os políticos, autoridades de saúde pública e investigadores podem avaliar melhor os efeitos de curto e longo prazo da poluição do ar na saúde e desenvolver estratégias para mitigá-la”, defendeu o investigador.

Tratado do Alto Mar: Organizações e cientistas portugueses saúdam acordo, mas deixam avisos

Baleia-de-bossa

Após quase duas décadas de negociações tortuosas, este fim-de-semana os países do mundo finalmente chegaram a um acordo para proteger a biodiversidade em águas internacionais, ou seja, aqueles ecossistemas e habitats que estão além das jurisdições nacionais e, por isso, mais vulneráveis a atividades ambientalmente prejudiciais.

António Guterres, Secretário-geral das Nações Unidas, apelidou o resultado de “uma vitória para o multilateralismo”, que tem recentemente estado sob grande pressão, especialmente devido ao atual contexto geopolítico e à tensão crescente entre grandes potências políticas mundiais, como os Estados Unidos da América, a Rússia e a China.

Apesar das dificuldades e dos contratempos, as delegações nacionais alcançaram, por fim, um acordo que agora dá corpo ao que é já conhecido como o Tratado do Alto Mar, que, em linhas gerais, cria uma estrutura legal que permitirá designar 30% dos oceanos como áreas protegidas, canalizar mais fundos para a conservação da vida marinha e estabelecer regras sobre o acesso e a utilização dos recursos marinhos. Além disso, o acordo permitirá também regular atividades económicas que se desenrolem em águas internacionais para minimizar os seus impactos sobre os ecossistemas, como a pesca, o tráfego marítimo e até a mineração em mar profundo, através, por exemplo, de avaliações de impacte ambiental.

A importância deste tratado não pode ser subestimada, uma vez que, nesta altura, cerca de 10% de todas as espécies de plantas e animais marinhos enfrentam o risco de extinção, segundo estimativas da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), uma percentagem que poderá chegar aos 90% até 2100 se as emissões de gases com efeito de estufa se mantiverem elevadas, de acordo com um estudo publicado no ano passado na revista ‘Nature Climate Change’.

O representante da Organização das Nações Unidas afirma que este tratado é essencial para a concretização dos objetivos traçados pela Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e pela Estratégia Global para a Biodiversidade (também conhecido como Acordo de Kunming-Montreal) que prevê a proteção de, pelo menos, 30% dos ecossistemas em terra, no mar, na costa e de água doce até 2030.

O acordo suscitou também reações por parte da Comissão Europeia. Virginijus Sinkevičius, comissário responsável pelas pastas do Ambiente, Oceano e Pescas, descreveu o tratado como o “Acordo Azul” e declarou que se trata de “um momento histórico para os oceanos” e que foi agora dado “um crucial passo em frente” na preservação da diversidade da vida marinha, “que é essencial para nós e para as gerações vindouras”.

 

Agora, resta que 60 países ratifiquem o tratado nos respetivos parlamentos para que, por fim, passe a ter força de lei.

O que dizem os cientistas?

Maria João Franco Bebianno, Professora Catedrática Jubilada da Universidade do Algarve e membro do Centro de Investigação Marinha e Ambiental (CIMA), considera que a aprovação do Tratado ao Alto Mar “terá repercussões importantes na proteção e sustentabilidade dos oceanos e da biodiversidade”, pois “o oceano é o suporte de vida na terra e devem ser feitos todos os esforços para melhorar a sua saúde”.

Para a investigadora, este acordo permitirá definir “as fundações que irão permitir uma melhor gestão e proteção da biodiversidade marinha em áreas para além da jurisdição nacional, que é um assunto crítico para a manutenção da saúde do oceano”.

Mas deixa um aviso: o sucesso do Tratado dependerá de uma “implementação efectiva” por parte dos países signatários e tal exigirá “um trabalho conjunto de colaboração entre governos, cientistas e organizações da sociedade civil”. Maria João Franco Bebianno defende que “devem ser feitos todos os esforços para proteger e preservar o oceano para as gerações futuras”.

O alto-mar representa dois terços dos oceanos a nível global e cobre quase metade da Terra, o ‘planeta azul’.

Para José Xavier, investigador do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), da Universidade de Coimbra, o acordo alcançado “sem dúvida que foi um grande feito para a melhor gestão das águas internacionais”, ainda para mais quanto, atualmente, somente 1% das águas além das jurisdições nacionais estão protegidas por lei.

Em declarações à ‘Green Savers’, o cientista destaca o “papel importante” que Portugal desempenhou ao longo de todos os anos de negociações deste tratado, e salienta que agora falta “definir melhor os vários níveis de proteção nas várias regiões”, para que exista uma uniformidade quanto ao estabelecimento de áreas marinhas protegidas em alto mar, e “compreender melhor como este Tratado se relaciona com outras convenções”, tais como o Tratado da Antártida, que já abrange águas internacionais abaixo dos 60 graus de latitude (desde o pólo Norte) e a Convenção das Nações Unidas sobre do Direito do Mar, “que possui ações para a extensão da plataforma continental dos países”.

José Xavier diz que agora é preciso que os vários países passem o acordo para os seus respetivos ordenamentos jurídicos nacionais, algo que “pode levar anos”, pelo que quanto mais cedo isso acontecer, mais cedo se poderá começar a proteger os oceanos e toda a vida que neles habita e que deles depende, incluindo nós humanos.

Por seu lado, Joana Xavier, do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR), da Universidade do Porto, destaca que este “é um acordo há muito aguardado” e que considera ser “ambicioso e unificador”, que dá provas de que “é possível unir as mais diversas vozes (governos, sociedade civil incluindo populações indígenas, instituições científicas e académicas, e organizações não governamentais) em torno de uma visão coletiva de sustentabilidade (e equidade) para o futuro não só do Oceano, mas do Planeta como um todo”.

As tartarugas-verdes (Chelonia mydas) são apenas um das espécies de tartarugas marinhas afectadas pelas atividades em alto-mar, pois atravessam os oceanos em grandes migrações para se reproduzirem.

A cientista diz-nos, no entanto, que se podem desde já antever alguns “desafios”, como a relação do Tratado do Alto Mar com “outros instrumentos e quadros legais”, sobretudo com os que dizem respeito à pesca e à mineração em mar profundo, e também “a mobilização dos recursos financeiros necessários à implementação do acordo”.

“Será crucial que os compromissos e processos vertidos no acordo sejam devidamente implementados, monitorizados e avaliados. E isso requererá uma enorme cooperação e coordenação internacional entre todas as partes”, observa Joana Xavier.

O que dizem as organizações?

Catarina Grilo, responsável de Conservação e Políticas da ANP|WWF, diz-nos que o Tratado do Alto Mar agora conseguido “corresponde, de facto, ao resultado pretendido”, pois, além de ser legalmente vinculativo (pelo que se os Estados-parte não cumprirem com as regras serão penalizados), “cria, finalmente, um quadro legal internacional para a conservação da vida marinha e a contenção de atividades nocivas em pelo menos dois terços do oceano, localizado em águas internacionais”.

A ambientalista releva como um dos principais pontos positivos a obrigação de “atividades que possam ter um impacto na vida do oceano” passarem a estar sujeitas a avaliações de impacte ambiental, “criando-se assim uma janela de oportunidade para travar as atividades prejudiciais em curso e reduzir impactos ambientais acumulados sobre o oceano”, não a exploração de minerais nas profundezas dos mares, mas também “a captura e armazenamento de carbono em águas profundas, atividades sobre as quais há ainda muito pouco conhecimento”.

Conta-nos Catarina Grilo que a ANP|WWF vê também como positivo o facto de o tratado criar um órgão técnico e científico que “será fundamental para assegurar que as propostas e planos de gestão para áreas marinhas protegidas sejam devidamente avaliados, e que os relatórios de avaliação de impacto ambiental sejam recebidos e tornados acessíveis à comunidade internacional”, além de definir um Comité de Implementação e Cumprimento, que atuará como instância de resolução de litígios “que dá uma oportunidade aos Estados de tomarem medidas contra possíveis infrações”.

O corais contam-se entre os seres marinhos (uma combinação entre pequenos invertebrados e microalgas) que mais estão a sofrer com a poluição marinha e com o aumento da temperatura dos mares.

Olhando para Portugal, diz que a aprovação deste acordo cria uma boa oportunidade “para trazermos para cima da mesa a urgência de o Estado português avançar de vez com a regulamentação da Rede Nacional de Áreas Marinhas Protegidas, que está há vários anos em preparação, mas que tarda em ver a luz do dia”.

Será esse regulamento, explica-nos, que permitirá a “proteção efetiva de 30% do nosso mar”, uma vez que se estima que ainda menos de 10% das águas nacionais estão designadas como áreas marinhas protegidas (4% até às 200 milhas náuticas da costa, mas 7% se se considerar a plataforma continental estendida, até às 350 milhas náuticas). Para mudar isso e alcançar as metas definidas quer no Tratado do Alto Mar, quer no Acordo Global da Biodiversidade, é preciso mais investimento e uma melhor gestão das áreas marinhas protegidas, pois hoje “não estamos a proteger ativa e adequadamente a nossa natureza”.

Carolina Silva, da organização Zero, assevera que este acordo é “um passo histórico fundamental que nos coloca um pouco mais perto de concretizar a meta global de proteger 30% do oceano até 2030” e salienta também o reforço dos “critérios subjacentes às avaliações ambientais para analisar o potencial impacto das atividades comerciais antes do seu início”. Mas, a esse respeito, avisa que “os organismos internacionais existentes que já regulam atividades humanas como o transporte marítimo, as pescas e própria mineração em mar profundo” poderão, pelo menos até que o tratado entre em vigor, continuar a permitir essas atividades “sem seguirem as normas de impacto ambiental dispostas no Tratado”.

“A experiência diz-nos que estes organismos regulatórios, como a Organização Marítima Internacional, falham muitas vezes em alavancar a ação ambiciosa, rápida e rigorosa que se exige num contexto de emergência combinada do clima e do oceano”, aponta Carolina Silva, mas reconhece que “a expectativa é de que este acordo agora alcançado possa ajudar a reforçar a gestão destas atividades, contribuindo para efetivar abordagens coletivas que vão além do business-as-usual”.

Ainda assim, afiança que é “um sinal político crítico que coloca, finalmente, o oceano no topo da agenda internacional e que se espera que alavanque uma ação global no sentido de proteger este bem comum das crescentes pressões da atividade humana”, e espera que este tratado represente “uma abordagem precaucionária à exploração do alto mar, contribuindo para a regulação de atividades altamente poluentes e danosas como a sobrepesca, o transporte marítimo e a mineração em mar profundo”.

Apesar do que de bom este novo acordo traz para impulsionar a proteção dos oceanos e da vida marinha que neles pulula, Inês Cardoso, da Direcção Nacional da Liga para a Protecção da Natureza (LPN), o acordo peca por colocar como um dos principais princípios sobre os quais assenta o do ‘poluidor-pagador’, que defende, recordando a “hierarquia da mitigação”, que “deverá ser o último recurso e não a primeira linha orientadora”.

Por outro lado, a dirigente ambientalista afirma que a meta da proteção de 30% dos oceanos surge como algo indefinido “perante do vortex de perda de biodiversidade”, e porque o que acontece fora dessas áreas protegidas é “igualmente importante”.

“Proteger 30% de mar alto, e manter a partir de terra os objetivos expressos de crescimento económico como se este fosse possível e infinito, muito pouco irá contribuir para o alcançar dos objetivos de conservação, que são, por um lado reduzir a taxa de redução da biodiversidade, e por outro fomentar as condições para que esta recupere o que se tem vindo a perder”, acautela Inês Cardoso, que se mostra cética quanto à real capacidade que este acordo terá para verdadeiramente proteger a vida marinha.

“Se até aqui, nem as zonas dentro da jurisdição nacional, representaram uma prioridade concretizada, dificilmente que está fora do alcance logístico será prioritário”, aponta, e deixa-nos um conselho: “aguardemos”.

“Assegurar a conservação e o uso sustentável da diversidade biológica marinha das áreas além da jurisdição nacional, para o presente e no longo-prazo”. Este é o grande objetivo geral definido no texto do tratado como está atualmente redigido, e que foi acordado pelas delegações dos vários países das Nações Unidas, uma missão ambiciosa e inquestionavelmente urgente.

Resta-nos agora esperar para ver se os países signatários, realmente, colocam a proteção dos oceanos no topo das suas listas de prioridades e se são capazes de escutar os apelos da História, e de traduzir a retórica política em ações concretas, para o bem de todos, no mar, em terra, no planeta.

Fonte: Green Savers

Presidente da República saúda “acordo histórico” da ONU de proteção do alto mar

O Presidente da República saudou ontem o “acordo histórico” alcançado nas Nações Unidas de proteção do alto mar, considerando-o “fundamental para toda a comunidade internacional e para Portugal”, que “tem assumido uma posição liderante” na preservação do oceano.

Numa nota publicada no ‘site’ da Presidência da República, lê-se que Marcelo Rebelo de Sousa “congratula-se pela obtenção do acordo histórico”, alcançado “após dez anos de duras negociações”.

“É fundamental para toda a comunidade internacional e para Portugal, que tem assumido uma posição firme e liderante na preservação do oceano, na aposta no seu conhecimento e no desenvolvimento sustentável de uma economia azul”, refere o Presidente da República.

Marcelo Rebelo de Sousa salienta ainda que o tratado consagra “um dos compromissos expressos na Declaração de Lisboa ‘Nosso oceano, nosso futuro, nossa responsabilidade’”, adotada na Conferência dos Oceanos das Nações Unidas, que decorreu entre 27 de junho e 01 de julho de 2022 em Portugal.

Esse compromisso, segundo o chefe de Estado, era o da “obtenção urgente de um acordo ambicioso, ao abrigo da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, sobre a conservação e uso sustentável da diversidade biológica marinha de áreas além da jurisdição nacional”.

Os Estados-membros da Organização das Nações Unidas (ONU) alcançaram no sábado um acordo para estabelecer um tratado de proteção do alto mar, após mais de 15 anos de negociações.

O consenso foi alcançado após uma maratona de negociações que teve início a 20 de fevereiro e que deveria ter terminado na sexta-feira, mas que continuou durante a noite até sábado, com mais de 35 horas seguidas de discussões.

O documento define, entre outras coisas, as bases para o estabelecimento de áreas marítimas protegidas, o que deverá facilitar o compromisso internacional de salvaguardar pelo menos 30% dos oceanos até 2030.

A adopção formal do tratado, porém, vai ter de aguardar até que um grupo de técnicos assegure a uniformidade dos termos utilizados no documento e que este seja traduzido nas seis línguas oficiais da ONU.

Fonte; Green Savers

50 anos de CITES: Tráfico de espécies é uma “ameaça tremenda” à biodiversidade

Foi há precisamente 50 anos que a Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Fauna e Flora Selvagens (CITES) foi adotada. Em Washington, D.C., capital dos Estados Unidos da América, representantes de 80 países reconheceram que a vida selvagem é “uma parte insubstituível dos sistemas naturais da Terra que deve ser protegida” e que “os povos e os Estados são e devem ser os melhores protetores das suas próprias fauna e flora selvagens”.

Assim, no dia 3 de março de 1973, este tratado foi adotado e a 1 de julho de 1975 entrou em vigor. O objetivo? Assegurar que o comércio internacional de animais e plantas selvagens não represente uma ameaça para a sobrevivência dessas espécies.

Estima-se que todos os anos esse tipo de comércio gere milhares de milhões de dólares em todo o mundo, com centenas de milhões de animais e de plantas a atravessarem fronteiras, podendo passar, em muitos casos, por diversos países entre a origem e o destino.

A CITES, que conta hoje com 184 Estados-contratantes, pretende regular o comércio de espécies que se considerem estar ameaçadas, como forma de evitar que a sua exploração possa exceder a sua capacidade de recuperação. Ou seja, com este instrumento legal pretende-se impedir que espécies de animais e de plantas desapareçam devido a práticas comerciais insustentáveis.

Portugal juntou-se à CITES em dezembro de 1980 e a convenção passou a vigorar no país em março do ano seguinte.

Uma das características distintivas desta convenção são os seus Apêndices. No Apêndice I estão listada todas as espécies ameaçadas de extinção cuja sobrevivência está ou poder se afetada pela sua comercialização. Por isso, o comércio desses animais e plantas está sujeito a uma “regulação particularmente rigorosa”, como se pode ler o no texto da CITES, “para não ameaçar ainda mais a sua sobrevivência”. No entanto, geralmente o comércio destas espécies do Apêndice I é proibido.

O Apêndice II, por sua vez, é constituído, essencialmente, por espécies de fauna e de flora que, embora não estejam nesse momento, possam vir a ser empurradas para o limiar da extinção se a sua comercialização não foi devidamente regulada. O comércio internacional dessas espécies só é possível mediante a emissão de uma licença por parte da autoridade nacional competente. No caso de Portugal, essa responsabilidade recai sobre o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Por fim, existe um Apêndice III, pouco falado, que inclui espécies cujo comércio é regulado por algum dos Estados-contratantes e que, para garantir que não desaparecem por via da extinção, requerem a cooperação de outros países para controlar a sua comercialização a nível internacional.

Atualmente, estima-se que, no seu conjunto, os três Apêndices englobem mais de 38 mil espécies de plantas e de animais, sendo que 97% fazem parte do Apêndice I, 3% do Apêndice II e 1% do Apêndice III. Não importa o tamanho ou o grupo taxonómico ao qual pertença, se estiver ameaçada pelo comércio internacional essa espécie passará a fazer parte de um dos apêndices, e a grande maioria das espécies listadas são espécies de plantas.

Tal como acontece com outras convenções internacionais, no âmbito da CITES são convocadas Conferências das Partes (COP), também conhecidas com ‘conferências da vida selvagem’ durante as quais os vários Estados-contratantes são chamados a rever a implementar da convenção e a decidir sobre a inclusão ou retirada de espécies dos apêndices ou para mover espécies de um apêndice para o outro, consoante uma avaliação do seu estado de ameaça face ao comércio internacional.

No passado mês de novembro, teve lugar mais um desses encontros, a COP19, dessa feita no Panamá, onde de reuniram delegações de mais de 160 países, bem como diversas organizações da sociedade civil. Do encontro resultou a adoção de propostas, apresentadas pelos Estados-parte, que, no seu total, incluíram mais de 500 novas espécies de plantas e de animais nos apêndices para regular o seu comércio internacional, algo que o Secretariado da CITES, o órgão máximo que gere a implementação da convenção entre as COP, considera ser um sinal claro do compromisso dos países para combater a crise da perda de biodiversidade.

Na COP19 de novembro passado foram incluídas nos Apêndices da CITES 54 novas espécies de tubarões e de raias (elasmobrânquios), incluindo 19 que estão hoje ameaçadas ou criticamente ameaçadas de extinção.

Na COP19, é de destacar a adição aos Apêndices de 54 novas espécies de tubarões e raias, das quais 19 estão hoje ameaçadas ou criticamente ameaçadas de extinção, o que a organização ambientalista WWF considerou ser uma decisão “histórica”. A inclusão dessas espécies de elasmobrânquios faz com que agora perto de 90% do comércio internacional desses animais só possa acontecer mediante a emissão de uma licença e se não colocar em risco a sustentabilidade e sobrevivência dessas populações.

50 anos depois: CITES “longe de ser um tratado perfeito” mas “um dos mais bem-sucedidos acordos ambientais multilaterais”

Numa altura em que se estima que mais de um milhão de espécies enfrentam o real risco de desaparecerem por completo, que mais de 35% dos stocks de peixe a nível global estão a ser sobre-explorados, e que se prevê que o aumento da população humana mundial deverá colocar ainda maior pressão sobre os recursos naturais do nosso planeta, a proteção das espécies que estão sob a nuvem negra da extinção e das que, sem as medidas corretas, podem vir a sofrer o mesmo destino é de crucial importância.

Por isso, a CITES pode ser percebida como “um tratado que está entre o Comércio, o Ambiente e o Desenvolvimento Sustentável”, explicou-nos Ivonne Higuero, Secretária-geral da convenção, a partir de Washington, D.C., onde esta sexta-feira decorreram as celebrações do Dia Mundial da Vida Selvagem, uma efeméride criada pelas Nações Unidas que pretende chamar a atenção do mundo para a beleza da Natureza e de todas as formas de vida que dela fazem parte e para a urgência de as proteger.

Ivonne Higuero, Secretária-geral da CITES, falou com a Green Savers, por videochamada, enquanto estava em Washington DC, nos Estados Unidos da América, para as celebrações do Dia Mundial da Vida Selvagem.

Meio século após a adoção da CITES, e reconhecendo que “está longe de ser um tratado perfeito”, Higuero, que é bióloga de formação, acredita que esse é “um dos mais bem-sucedidos acordos ambientais multilaterais” e assinala que “sem esta convenção estaríamos numa situação bem pior”, referindo-se à perda de diversidade de espécies que hoje configura, a par da poluição e das alterações climáticas, uma das maiores crises planetárias dos nossos tempos.

A responsável recorda que, através desta convenção, foi possível ajudar os Estados-contratantes a melhorarem e a reforçarem as suas legislações nacionais sobre o comércio internacional de espécies ameaçadas de animais e de plantas e até fazer com que país que não tinham essa legislação passassem a tê-la.

O trabalho dos Estados-parte da CITES, segundo Higuero, permitiu já melhorar o estado de conservação de várias espécies, levando à sua passagem do Apêndice I, o nível mais alto de proteção ao abrigo da convenção, para o Apêndice II. No entanto, disse-nos que não têm feito essa transição tantas espécies quanto as que gostaria, “pois isso realmente demostra o sucesso da convenção, mas é encorajador ver algumas a passarem do Apêndice I para o Apêndice II”. E, em alguns casos, embora mais restritos, tem sido mesmo possível retirar completamente as espécies das listas devido aos aumentos populacionais que permitem afastar o perigo de extinção devido ao comércio.

Tráfico de espécies é uma “ameaça tremenda” à biodiversidade

A SG da CITES salientou também que este tratado tem sido uma importante ferramenta no combate ao tráfico ilegal de espécies ameaçadas, promovendo uma maior transparência e rastreabilidade do comércio desses animais e plantas, desde o local em que foram colhidos até ao destino final. A esse respeito, destacou o trabalho que tem sido feito, especialmente ao nível do Consórcio Internacional de Combate aos Crimes contra a Vida Selvagem (ICCWC), em colaboração com a Interpol, com o Banco Mundial, com o Gabinete das Nações Unidas para as Drogas e o Crime (UNODC) e com a Organização Mundial das Alfandegas.

“Por todo o mundo, são feitas cada vez mais apreensões de vida selvagem comercializada ilegalmente”, contou-nos, especialmente nas zonas portuárias, que são muitas vezes as portas de entrada para produtos derivados da vida selvagem que violam as regras da CITES.

Resultado da operação ‘Thunder 2022’, no âmbito do Consórcio Internacional de Combate aos Crimes contra a Vida Selvagem (ICCWC). Foram apreendidos quase 800 kg de marfim de elefantes, 25 chifres de rinoceronte, 119 grandes felídeos cinco toneladas de plantas de espécies ameaçadas, 750 aves, 9 pangolins, 34 primatas, quase dois mil répteis e mais de mil tartarugas, entre muitos outros.

Apesar dos esforços, Higuero considera que “temos de fazer muito mais para combater essas organizações criminosas internacionais que estão envolvidas no tráfico de espécies ameaçadas”, mas observou que, de facto, tem sido possível verificar uma melhoria na capacidade para frustrar essas atividades ilegais.

O tráfico de espécies selvagens ameaçadas “é definitivamente uma ameaça tremenda”. Ao contrário do comércio legal, em que é possível perceber se uma espécie está a ser sobre-explorada e aplicar medidas para resolver o problema, a avaliação do impactos do comércio ilegal nas espécies é muito mais difícil.

“Temos grandes apreensões de escamas de pangolins. Quantos animais estão a ser mortos? Não conseguimos saber ao certo”, contou-nos Higuero, reconhecendo, no entanto, que se trata de uma ameaça “muito difícil de combater”. Como tal, defende que a formação das autoridades fiscalizadoras do comércio e a implementação de ferramentas tecnológicas, como Inteligência Artificial, são muito importantes nessa luta.

“Claro que o ideal é deixar de haver apreensões. Não porque não há capacidade para fazê-las, mas porque esses crimes já não acontecem”, confessou-nos a responsável, argumentando que os crimes contra a vida selvagem “devem ser tratados como qualquer outro crime grave, com penalizações, com multas e com penas de prisão significativas”, que, segundo Higuero, devem ser aumentadas e não ser meros castigos simbólicos.

A caça-furtiva, especialmente de elefantes e de rinocerontes, e o comércio de certos produtos derivados de espécies em risco, como bexigas-natatórias de vaquitas, o cetáceo mais ameaçado em todo o mundo, têm diminuído nos últimos anos, de acordo com a responsável, mas “temos de nos manter atentos”. E o tráfico ilegal de madeiras e de enguias, por exemplo, continua a ser “muito preocupante”, alertou Higuero, acrescentando que “ouvimos falar muito do tráfico de marfim de elefantes, mas menos de pau-rosa”, um material que ainda é alvo de “uma grande procura”.

A vaquita (Phocoena sinus) é o cetáceo mais ameaçado do mundo.

Assim, “não há como negar que ainda há procura por estes produtos”, pelo que “temos de continuar a luta contra os crimes contra a vida selvagem”.

Na proteção da biodiversidade, não podemos esquecer as comunidades locais e os povos indígenas

A Secretária-geral da CITES lembrou também que é preciso não esquecer os impactos que a restrição do comércio de espécies selvagens tem sobre as comunidades locais e povos indígenas, pois para muitos grande parte do seu rendimento, ou mesmo a sua totalidade, depende desse comércio.

“Trabalhamos com eles para que possam perceber melhor a responsabilidade que têm manter esses habitats onde esses animais e plantas selvagens existem, procuramos assegurar que são recompensados pelo trabalho que fazem e que as suas vozes são ouvidas”, relatou Ivonne Higuero, sustentado que existem já estudos que comprovam que as terras geridas por povos indígenas e comunidades locais, que tenham direitos sobre elas, prosperam muito mais do que outras que não o são.

Investimento e redução da procura são a chave para combater o comércio ilegal e preservar a vida selvagem

Quanto ao futuro, Ivonne Higuero mostra-se confiante de que a CITES continuará a sua missão de combater atividades criminosas e ilegais que contribuam para a perda de biodiversidade. Destaca a crescente digitalização das licenças de comércio, para combater os riscos de fraude e corrupção, o papel dos jovens na redução da procura por produtos do comércio irregular de vida selvagem e na consequente redução da oferta, e a consolidação do papel da convenção enquanto mais uma ferramenta para ajudar a evitar novas pandemias, embora, claro, admita que “nunca será zero”.

E o financiamento é, obviamente, algo que não só é fundamental para combater o comércio ilegal de espécies ameaçadas, mas também para revitalizar a Natureza, reparar os danos que por nós lhe foram e continuam a ser infligidos e ajudar as plantas e os outros animais a recuperarem de séculos de exploração desmedida.

Higuero afiançou que “é realmente preciso perceber que investir na biodiversidade, investir a Natureza, é algo que vale a pena fazer, porque ganhamos muito com isso”, não somente, e não de somenos importância, para garantir a diversidade de vida que torna o nosso planeta único, mas também porque isso e investir no nosso próprio bem-estar e que podemos continuar a beneficiar dos serviços, muitas vezes indispensáveis (como a polinização, os ciclos de água, a captação de carbono), que os ecossistemas nos proporcionam, e dos quais nós quase nunca nos apercebemos ou tomamo-los por garantidos.

E porque a conservação das espécies “tem custos”, o dinheiro não pode vir apenas da esfera pública. Para a Secretária-geral da CITES, deve também fluir do setor privado, não só de empresas, mas também de pessoas com grandes fortunas, que podem ser fundamentais para assegurar que conseguimos estancar a perda de biodiversidade e que podemos recuperar a Natureza.

“É fundamental passar a mensagem de que não há necessidade para comprar produtos ilegais, pressionar os governos para que façam o que é correto e que penalizem os criminosos e assegurem que cumprem penas de prisão para que não seja um crime fácil de cometer”, sublinhou Ivonne Higuero, acautelando, ainda assim, que é preciso também encontrar alternativas ao comércio ilegal de espécies ameaçadas, porque em muitos casos essa via é a única fonte de subsistência e é uma realidade que não pode ser ignorada, pois essas pessoas “também precisam de por comida na mesa, de educar os seus filhos e de ter acesso a saúde”.

Fonte: Green Savers

Descoberta na Austrália nova espécie de geco com cauda em forma de folha

Nova espécie de geco (Phyllurus fimbriatus), descoberta numa ilha a 50 km da Austrália continental, na mão de Conrad Hoskin, cientista que os descobriu.

Foi na paradisíaca ilha de Scawfell, a 50 quilómetros da costa da Austrália continental e rodeada pelas mesmas águas que banham a Grande Barreira de Coral, que Conrad Hoskin, da Universidade James Cook, descobriu uma espécie de geco até agora desconhecida da Ciência.

Batizado com o nome científico Phyllurus fimbriatus, o réptil é endémico da costa oriental australiana e vem juntar-se às 10 espécies que pertencem a esse género. Quando o descobriu, em novembro de 2021, Hoskin participava numa exploração científica de quatro dias que tinha como objetivo estudar os gecos Phyllurus, bem como outros lagartos nessa ilha remota.

Geco Phyllurus fimbriatus perfeitamente camuflado numa rocha, na ilha de Scawfell, Austrália.

Num artigo publicado recentemente na revista ‘Zootaxa’, o investigador escreve que a morfologia e padrões nas escamas do novo geco o distinguem “obviamente” das outras espécies desse género que já foram descritas.

Com uma face bicuda, patas longas e finas e uma cauda em forma de folha, este geco pode chegar aos 11 centímetros de comprimento. Hoskin considera que “é incrível ainda encontrar espécies grandes e espetaculares nos dias que correm”, apontando que “o facto de este geco se ter mantido escondido da ciência mostra que existem ainda áreas na Austrália com segredos por desvendar”.

A nova espécie de geco (Phyllurus fimbriatus) foi descoberta numa ilha ao largo da costa australiana.

P. fimbriatus foi descoberto numa área repleta de grandes rochas debaixo de figueiras e rodeadas por fetos. A sua coloração serve, segundo o cientista, como uma camuflagem perfeita, que permite ao réptil passar despercebido aos olhos dos predadores enquanto se aquece ao sol no topo de um dos muitos pedregulhos que cobrem a ilha de Scawfell.

Hoskin não sabe ao certo qual a dimensão da população de P. fimbriatus, mas conseguiu perceber que existem, pelo menos, 30 indivíduos na ilha, e apela a que sejam realizados mais estudos na área para se poder avaliar o estado de conservação desta nova espécie e, se necessário, actuar para conservá-la.

Geco Phyllurus fimbriatus

 Austrália tem sido um dos países mais fustigados por incêndios florestais, sobretudo durante a época do verão. No entanto, Hoskin acredita que “as rochas são provavelmente proteções muitos boas contra o fogo”, mas avisa que as espécies invasoras, como o Hemidactylus frenatus, e a captura ilegal podem pôr em risco a estabilidade e sustentabilidade da população destes gecos, uma ameaça partilhada com outras espécies.

O cientista, apesar de reconhecer que a ilha de Scawfell está abrangida pelo Parque Nacional de South Cumberland, alerta que o fogo é uma ameaça que merece especial atenção por parte dos investigadores e das autoridades gestoras da vida selvagem, salientando que “o aumento das ondas de calor e/ou das secas devido às alterações climáticas podem resultar numa mudança da frequência ou da intensidade dos incêndios” nesse pequeno território insular.

Local onde a nova espécie Phyllurus fimbriatus foi descoberta.

Resta agora saber se a P. fimbriatus é exclusivo da ilha de Scawfell, mas Hoskin adianta no artigo que não foram encontrados gecos do género Phyllurus nas ilhas circundantes, o que leva a crer, embora ainda sem sustento científico robusto, que a nova espécie poderá apenas ocorrer nesse pedaço de terra, relativamente intocado pelos humanos, no Mar de Coral.

Fonte: Green Savers

A protecção dos oceanos é fundamental para combater a crise climática. Mas estaremos a fazer o suficiente?

“Travar a emergência nos oceanos é uma corrida que temos de vencer”. Este aviso foi deixado pelo Secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, numa cimeira dedicada aos oceanos que decorreu no passado mês de janeiro, na cidade de Mindelo, em Cabo Verde. Instando o mundo a mobilizar-se pela defesa dos ecossistemas marinhos, o português frisou a urgência de “preservar esta preciosa dádiva azul para os nossos filhos e netos”.

Quase meio ano antes, na Conferência dos Oceanos que transformou Lisboa no epicentro da diplomacia oceânica, Guterres afirmou que, embora o oceano ligue o mundo, temo-lo tomado como “garantido”, alertando que a relação dos humanos com a Natureza está a fazer subir a temperatura dos mares, põe em risco as zonas costeiras, ameaça fazer desaparecer os Estados insulares e acidifica os oceanos, degradando e devastando a vida que neles habita.

Todos os anos, cerca de 80% das águas residuais de todo o mundo são despejadas nos ecossistemas marinhos sem qualquer tratamento e perto de oito mil milhões de toneladas de plástico acabam nos oceanos anualmente. Até 2050, a quantidade total de plástico nos oceanos poderá pesar mais do que todos os peixes juntos.

“Não podemos ter um planeta saudável sem ter um oceano saudável”, sustentou, alertando que o fracasso poderá ditar o colapso da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, cujo objetivo 14 prevê a conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos.

Além da poluição e das alterações climáticas, a pesca insustentável surge como outras das grandes ameaças. Estima-se que em 2019 mais de um terço dos stocks de peixe a nível global estivessem a ser alvo de sobre-exploração. A juntar a tudo isso, mais de metade do oxigénio no planeta é produzido pelos oceanos, pelas pradarias de ervas marinhas e pela algas fotossintéticas.

Por isso, a proteção dos oceanos é fundamental para combater a crise climática. Mas estaremos a fazer o suficiente?

Esta semana, na 10.ª cimeira mundial dos oceanos promovida pelo jornal ‘The Economist’, que decorreu no Centro de Congressos de Lisboa, Olivier Poivre d’Arvor, embaixador especial do Presidente francês Emmanuel Macron para os pólos e assuntos marítimos, respondeu a essa pergunta com um rotundo ‘não’, apontando, numa mensagem endereçada aos líderes mundiais, que, no que toca à proteção dos oceanos, não basta falar, é preciso agir.

A 10.ª cimeira mundial dos oceanos foi promovida pelo jornal The Economist, e aconteceu esta semana no Centro de Congressos de Lisboa, reunindo mais de 1.500 participantes de todo o mundo.

O diplomata francês tem feito parte das negociações que estão a decorrer na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, para criar um tratado global para proteger e conservar os ecossistemas marinhos em águas internacionais. Até amanhã, dia 3 de março, as delegações dos Estados-membros da ONU deverão apresentar um consenso sobre esse instrumento vital para a proteção dos oceanos, e que está a ser negociado há 15 anos.

Contudo, Olivier Poivre d’Arvor lamentou que, na terça-feira, ainda se estava longe de alcançar um acordo entre os vários países, apelando às populações de todo o mundo que pressionassem ainda mais os seus governos. “Toda a gente diz que se preocupa com os oceanos, mas está na altura de prová-lo”, sentenciou.

O quadro é ainda mais negro quando olhamos para o atual panorama geopolítico mundial. O diplomata francês revelou que as conversações sobre um tratado para a proteção do alto-mar, isto é, da biodiversidade em águas além das jurisdições nacionais, tem deparado com obstáculos, designadamente levantados pela Rússia e pela China, comentando que as negociações com esses dois países são “totalmente impossíveis”. Assim, é muito provável que não seja possível chegar a um consenso até ao final desta semana, tal como inicialmente previsto e depois de mais de uma década de trabalho.

Em cima de uma outra mesa de negociações está a mineração em mar profundo, uma atividade de extração de minérios no fundo dos mares que, de acordo com os ambientalistas e com um corpo científico cada vez maior, poderá ter impactos desastrosos na vida marinha.

As previsões apontam para que em julho deste ano a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA) possa, por fim, permitir a mineração em mar profundo, abrindo as portas à exploração a uma escala industrial das profundezas marinhas, um mundo sobre o qual pouco se sabe. Aliás, há mesmo quem diga que hoje sabemos mais sobre a superfície da Lua do que sobre o fundo dos nossos mares.

França é um dos países que se opõem à mineração em mar profundo, liderando uma coligação de perto de 20 Estados que querem manter no solo os minerais marinhos. “Não é tempo para isso”, apontou Olivier Poivre d’Arvor, argumentando que a saúde dos oceanos está já gravemente debilitada e que “não sabemos que impactos ambientais” a mineração poderá gerar.

Por isso, esse conjunto de países quer impedir que a mineração em mar profundo seja aprovada este ano e, se possível, adiá-la por 15 ou 20 anos, com o diplomata francês a frisar que não é uma atividade que seja economicamente viável, pelo menos não atualmente.

“Para os oceanos, precisamos de um acordo ao estilo do que foi alcançado para o clima em Paris, em 2015”, apelou.

É precisa uma cidadania mais ativa para proteger os oceanos (e o planeta)

Em 2017, ocorreu, em Nova Iorque, a primeira conferência das Nações Unidas especialmente dedicada aos oceanos. Apesar de alguns progressos feitos desde então, ainda ficou muito por fazer.

Para Zara Teixeira, investigadora do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), o estado dos oceanos deve ser hoje motivo de grande preocupação. Um conjunto de ameaças, entre as quais a sobre-exploração, a poluição, a destruição de habitats e os efeitos das alterações climáticas, atiram o futuro dos oceanos para o domínio da incerteza.

Zara Teixeira, investigadora do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), da Universidade de Coimbra, falou com a Green Savers à margem da .ª cimeira mundial dos oceanos promovida pelo jornal The Economist, que decorreu esta semana no Centro de Congressos de Lisboa.

Ainda assim, a cientista reconhece que nos últimos tempos se tem desenvolvido “uma maior consciência” dos impactos humanos sobre os ecossistemas marinhos. Atualmente, empresas, governos e as populações em geral têm tentado “minimizar” os seus impactos nos oceanos, salientou, e acredita que, pelo menos, “estamos no caminho para tentar melhorar”.

À margem da conferência, Zara Teixeira chama-nos a atenção para a relação de interdependência entre os vários fatores que põem em risco a saúde dos oceanos. A perda de habitat, os declínios da biodiversidade e as alterações climáticas são ao mesmo tempo causas e consequências, pelo que para combater uma é preciso combater as restantes.

Pessoalmente, a investigadora considera que a prioridade deve ser o combate às alterações climáticas, uma vez que as suas gravidade e dimensão “continuam a ser negligenciadas”.

“Acho que não há ainda uma consciência dos verdadeiros impactos globais das alterações climáticas”, sublinhou, avisando que podemos estar a subestimá-lo, seja ao nível político, porque as decisões que devem ser tomadas podem mexer com interesses poderosos, seja ao nível das próprias comunidades, que, mesmo perante a sua dimensão assombrosa, tendem a desvalorizar o problema e “não querem acreditar nisso”.

“É uma realidade muito dura de encarar, porque os impactos são muito fortes e implicam investimentos financeiros muito grandes e profundas mudanças de estilos de vida”, disse-nos Zara Teixeira.

Por isso, a luta pela proteção do planeta deve ser de todos, porque é para todos, e não pode, nem deve, ser deixada a pequenos grupos de decisores políticos ou líderes de grandes agentes económicos.

A cientista contou-nos que reconhece um grande valor nas manifestações climáticas mobilizadas por jovens ativistas, que ocorrem frequentemente um pouco por todo o mundo, especialmente no chamado ‘Norte Global’, incluindo em Portugal. Mas lamenta que depois não haja consequências a nível político, que deem uma verdadeira resposta a essas reivindicações.

Assim, é preciso energizar uma cidadania ativa, “que tem estado muito adormecida”, especialmente em Portugal, explicando a investigadora que isso “não tem de implicar um ativismo agressivo”. Pequenas ações, como escolher nos supermercados os produtos com os menores impactos ambientais, são fundamentais e estão ao alcance de todos nós.

E defende que o Governo deveria implementar mais medidas que ajudem a população a fazer as melhores escolhas. E Zara Teixeira dá exemplos. O pescado capturado mais perto da nossa costa poderia ser vendido a um preço inferior ao que é capturado em águas mais distantes ou estar sujeito a um IVA reduzido (ou mesmo isento de IVA), uma vez que teria uma menor pegada carbónica.

Mas para isso é preciso que as pessoas saibam o que estão a comprar. Por isso, a certificação pode ser uma forma de ajudar os consumidores a optarem por produtos que tenham menores impactos no planeta e, assim, a contribuírem ativamente para o combate às alterações climáticas.

A investigadora argumenta que é importante que o conhecimento produzido pela Ciência possa depois ser entendido e aplicado, por exemplo, pelas empresas, para que possam reduzir os seus impactos ambientais. O MARE está atento a isso, e já constituiu grupos de trabalho especificamente dedicados à construção de ‘pontes’ entre os mundos científico e empresarial, numa lógica de investigação aplicada e de colocação da Ciência ao serviço da transformação da forma como as empresas, e todas as populações, se relacionam com o Ambiente.

Nesse campo, Zara Teixeira disse-nos que é possível notar um grande aumento do interesse das empresas em reduzir os seus impactos, seja porque a isso são obrigadas por lei, seja porque daí resultam benefícios financeiros, seja porque estão realmente preocupadas com o atual estado do planeta e querem contribuir ativamente para a sua proteção.

Questionada sobre se Portugal está a fazer o suficiente para proteger os oceanos, a cientista disse-nos que “falta alguma coragem política” para tomar as decisões que têm de ser tomadas e para aplicar os investimentos necessários, uma vez que o conhecimento científico existe, mas resta encarar a realidade e trilhar o caminho mais acertado.

E recordou que houve alturas no passado em que foi dada uma maior importância ao mar e ao desenvolvimento económico que ele possibilita, algo que hoje não é tão evidente, embora a economia do mar tenha vindo a crescer nos últimos anos. Mas “ainda há muita margem para crescimento”, assinalou.

Contudo, alerta que é preciso que a economia baseada no mar seja realmente sustentável, para ser possível fazer coexistir o desenvolvimento económico com os objetivos de conservação dos ecossistemas marinhos e para não agravar a sua deterioração.

O futuro dos oceanos e, claro, também do planeta avizinha-se incerto e pouco luminoso. Ainda assim, Zara Teixeira afirmou que, enquanto cientista dedicada ao elemento que faz da Terra o ‘planeta azul’, “para mim faz sentido continuar a lutar” e a contribuir para a proteção dos oceanos, embora, tomando a História como referência, não seja possível ter a certeza de que os líderes mundiais terão a coragem para fazer o que precisa de ser feito.

Fonte: Green Savers